Dedicatória
Dedico esta história
aos guardiões da terra —
os povos indígenas que, há séculos, escutam o solo,
conversam com as árvores
e entendem o silêncio da chuva.
Aos moradores de Ivinhema,
que convivem com a força da Boca da Terra
e aprendem, dia após dia,
que respeitar a natureza é também respeitar a si mesmos.
E às crianças,
que herdarão este chão,
com a missão de curá-lo, protegê-lo
e continuar ouvindo o sussurro da sabedoria ancestral.
Com gratidão,
Helena Zanchi
A Lenda da Boca da Terra
“A terra está inquieta,” murmurou. “Ela quer falar.”
“Yandê,” disse Iracy, “há uma ferida crescendo no chão. Uma ferida feita por mãos apressadas e olhos que não enxergam.”
Yandê começou a investigar. Conversou com os mais velhos, ouviu histórias sobre desmatamento, sobre raízes arrancadas, sobre a terra que perdeu sua pele.
“A terra sem cobertura é como corpo sem proteção,” disse Iracy. “Ela se fere, se abre, se parte.”
Com o tempo, as árvores voltaram a florescer, os pássaros retornaram, e o solo, antes ferido, começou a respirar em paz.
Yandê, agora mais velha, caminhava com crianças da aldeia e da cidade pelo antigo local da cratera. Onde antes havia medo, agora havia bancos de madeira sob a sombra das árvores, trilhas com placas que contavam a história da terra, e um espaço onde famílias se reuniam para ouvir, brincar e aprender.
Ali, onde a terra um dia gritou, agora ela sorria.
Diziam que a ideia de transformar aquele espaço em um ponto de encontro para todos surgiu de um homem da cidade que sentiu um chamado da natureza divina — alguém que acreditava que cuidar da terra era honrar a criação.
E assim, a Boca da Terra se tornou mais que uma cicatriz: virou um jardim de memórias, um símbolo de reconciliação entre o humano e o natural.Quando a chuva tocava o chão, os moradores de Ivinhema se aproximavam — atentos, unidos, em reverência. E a terra, que um dia gritou, agora sussurrava com ternura: “Obrigada por me escutarem. Obrigada por me curarem. Obrigada por me amarem.”




